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Diretor de “Pureza”, Renato Barbieri evidencia participação do Poder Judiciário na realização do filme

Longa-metragem será exibido na próxima sexta (3) no TRT-13 com a presença do diretor, da ativista Pureza Loyola e da procuradora do MPT, Marcela Asfóra
publicado: 01/02/2023 13h54 última modificação: 02/02/2023 14h41

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O diretor de cinema Renato Barbieri estará no evento desta sexta-feira (3) e irá participar de uma roda de conversa

O Tribunal Regional do Trabalho da Paraíba (13ª Região) realiza na próxima sexta-feira (3) o evento “Erradicação do Trabalho Escravo Contemporâneo", a partir das 9h. Uma das atrações é a exibição do filme “Pureza”, do diretor Renato Barbieri, que estará presente na ocasião para participar de uma roda de conversa, que contará ainda com a presença da ativista Pureza Loyola, cuja história real inspirou a produção, e da procuradora do trabalho Marcela Ásfora.

O diretor Renato Barbieri concedeu uma entrevista à equipe da Assessoria de Comunicação Social do TRT-13, revelando os detalhes da produção e a participação ativa do Poder Judiciário e da Justiça do Trabalho na realização da obra. Confira a conversa a seguir:

Como a história de dona Pureza chegou até você?

Renato Barbieri: Lancei meu primeiro filme de ficção, chamado “As Vidas de Maria”, em 2005, e foi minha primeira incursão em longa-metragem 100% ficcional, porque eu fiz muito doc-fic, documentários com elementos ficcionais, já tinha alguma experiência com elenco, mas a mais radical foi nessa primeira ficção, que foi onde eu mergulhei de fato. Quando parti para o segundo projeto, passei a desejar fazer um filme mais universal, que tivesse conteúdo de brasilidade, que são os conteúdos dos meus documentários. 

Um colaborador que trabalhava comigo, na parte de roteiros, indicou um amigo, o fotógrafo Hugo Santarém, que já havia tido contato com a história de dona Pureza. Quando eu li a pesquisa que Hugo havia feito, eu na mesma hora falei, “é exatamente o que eu estou buscando”. Já tinha trabalhado o tema da escravidão nos documentários “Atlântico Negro – Na Rota Dos Orixás” e “Terra de Quilombos – Espaços de Liberdade” e também sobre os excluídos em outras produções que fiz. Foi aí que eu decidi cair de cabeça no projeto.

E como foi o processo de transformar essa história em filme?

RB: O primeiro passo foi fazer contato com a dona Pureza. Por meio de uma rede ligada à CNBB, e como a Comissão Pastoral da Terra (CPT) estava envolvida, por conta da atuação do padre Flávio (Lazzarin), eu acabei chegando nela e viajei até Bacabal, no Maranhão, em dezembro de 2007. De lá para cá, foram muitas conversas, tratamento de roteiro com várias equipes, a batalha para conseguir recursos, começar a juntar a equipe, convidar Dira Paes, é tudo uma longa história. Foi um filme feito por muitos braços e mentes, uma história que terminou em dezembro de 2019, exatos 12 anos desde meu primeiro contato com Dona Pureza. 

Como foi a recepção do público e da crítica à produção? O longo esforço de mais de uma década gerou bons frutos, pelo que é possível perceber.

RB: Lutamos para apresentá-los em festivais de cinema nacionais e internacionais. Até agora, já circulamos por mais de 40 festivais, espalhados por 19 países. Ganhamos 29 prêmios, se tornando a ficção brasileira mais premiada no período da pandemia, entre 2020 e 2021.

A obra conta com o apoio de instituições como o TRT da 8ª Região e diversas entidades voltadas ao combate do trabalho análogo ao escravo. De que maneira o Judiciário colaborou para a construção dessa história e na produção do filme?

RB: O filme contou com a colaboração muito direta da sociedade civil organizada como a CPT e o Repórter Brasil, além de agentes do Estado, como o TRT da 8ª Região e o Ministério Público do Trabalho (MPT). Ao todo, foram 23 organizações nacionais e internacionais que ajudaram este projeto a sair do papel. Após as exibições do filme, especialmente em 2022, o número subiu para 96. O Poder Judiciário nos auxiliou com apoio logístico que a gente fez pesquisa de locação com apoio de entidades como a Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (Anamatra), o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinart); todos deram um apoio importantíssimo, além do aporte financeiro do TRT8 e do MPT, que nos permitiram fazer um grande planejamento.

Dira Paes interpretou a história de luta por justiça de Dona Pureza"A chegada de Dira só engrandeceu ainda mais o projeto, pois só uma atriz do calibre de Dira Paes conseguiria interpretar outra figura grandiosa como dona Pureza" 
                                  Renato Barbieri

Embora seja um filme que lide uma temática social relevante, "Pureza" é uma obra de fácil identificação e muito disso se dá pela figura de dona Pureza, cuja história inspira e comove quem a conhece. Parte disso também se deve ao trabalho de Dira Paes na hora de interpretá-la. Como foi essa relação com as duas, dona Pureza e Dira Paes?

RB: Contamos a história de uma heroína contemporânea brasileira, é uma honra poder ter alguém como dona Pureza por perto. A chegada de Dira só engrandeceu ainda mais o projeto, pois só uma atriz do calibre de Dira Paes conseguiria interpretar outra figura grandiosa como dona Pureza. Foi muito inspirador esse encontro entre elas, Dira captou o inconsciente da personagem e traduziu em tela. O mais legal é que ela já conhecia dona Pureza porque a Dira é uma abolicionista, já foi presidente do Movimentos Humanos Direitos (MHuD), criado pelo padre Ricardo Rezende da CPT, então a relação entre as duas durante a produção do filme foi ótima, repleta de admiração mútua. Eu fico encantado quando tenho a oportunidade de vê-las juntas em exibições do filme, é uma força magnética que existe ali.

Quais foram as locações do filme? Que desafios as gravações impuseram à equipe e como vocês conseguiram superá-las? 

RB: A gente fez uma pesquisa de locação muito incrível, por todas as cidades do Pará e do Maranhão que dona Pureza, encontrando pessoas que cruzaram com ela no período de sua jornada heróica, entre 1993 e 1995. Definimos Marabá, no Pará, como cidade cenográfica porque foi uma das cidades pelas quais ela passou e também por ter sido um local onde esses crimes aconteciam com muita intensidade. Hoje, com as políticas de combate à exploração do trabalho e da ação firme do sistema da Justiça do Trabalho, esses números diminuíram bastante.

A estrutura da cidade também foi benéfica para nossa produção. Os vários bairros de Marabá nos possibilitaram representar em tela diferentes cidades sem precisar fazer grandes deslocamentos com nossa equipe. A cidade também possui duas rodoviárias, cada uma com uma fachada diferente. Fotograficamente, tínhamos recursos para filmar tudo lá, o que economizou custos. Deslocamento em produções cinematográficas é caríssimo, muita gente, muito equipamento, muito tudo. Ao todo, foram sete semanas de filmagem em Marabá e cenas adicionais em Brasília. 

Durante a produção do filme, vocês enfrentaram alguma espécie de retaliação ou intimidação por parte de fazendeiros e pessoas envolvidas na exploração de trabalho análogo à escravidão? Como vocês se precaveram diante dessa possibilidade?

RB: Olha, cara, graças a Deus a gente nunca teve nenhuma ameaça, pelo contrário. A gente teve apoio da comunidade de Marabá, desde o Poder Público até a população local, que nos forneceu objetos de cena. Foi algo fabuloso. Nunca tivemos nenhum olhar cruzado, nenhuma palavra áspera. Eu acho que houve uma uma legitimidade muito grande do filme e sou muito grato por isso.

Por fim, "Pureza" transporta para as telas do cinema e agora também para o streaming uma história real, mas que para muitas pessoas ainda parece algo distante ou que está relegada ao passado. Qual é o recado que você dá às pessoas que não conseguem perceber ainda a contemporaneidade da história de Pureza e seu filho?

RB: A gente enquanto equipe, assim como todo o conjunto de organizações, instituições e movimentos sociais que apoiam o filme, tinha um propósito muito claro ao fazer “Pureza”, que era trazer para os holofotes algo que está na invisibilidade, especialmente para as pessoas da cidade, da grande mídia. As pessoas não têm consciência do que se passa lá no interior da Amazônia. Botamos elas dentro da cena e damos o recado que ainda hoje temos centenas de milhares de brasileiros e brasileiras que são submetidos ao trabalho análogo ao escravo.

A sociedade brasileira acredita que somos uma nação livre, mas enquanto tivermos escravizados no Brasil, a gente não é uma nação livre. Ouso dizer que nunca tivemos um dia sequer como nação livre, porque no dia seguinte da assinatura da Lei Áurea, que teoricamente faria a abolição da escravatura, começou a escravidão em sua forma contemporânea. Cabe à nossa geração começar a escrever um novo livro, pois o que temos até agora é uma história secular de escravidão e ininterrupta, de uma escravidão que mudou de forma, mas que em sua essência, a da exploração do trabalho e da exploração dos corpos, continua a mesma.

André Luiz Maia
Assessoria de Comunicação Social TRT-13

 

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