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“Reforma Trabalhista não aumentará número de empregos”

Veja na íntegra a entrevista do presidente do TRT, desembargador Eduardo Sergio de Almeida, no Portal Paraíba Total
publicado: 24/03/2017 13h15 última modificação: 27/03/2017 10h50

O presidente do Tribunal do Trabalho da Paraíba (13ª Região), desembargador Eduardo Sergio de Almeida é o entrevistado desta semana do Portal Paraíba Total. Na entrevista o magistrado destacou o aumento no número de ações na Justiça do Trabalho e falou sobre a Reforma Trabalhista.

Veja a entrevista na íntegra:

Estamos com ascendência em ações, pois a crise aumentou o número de demissões e de cidadãos em busca de seus direitos trabalhistas na Justiça”

Novo presidente do Tribunal Regional do Trabalho na Paraíba diz como a crise econômica impactou a Justiça do Trabalho no Estado

A crise econômica, sem dúvidas, têm impactado os mais variados setores da sociedade, inclusive a Justiça do Trabalho. Desde que o período de recessão se instalou no País, só aqui na Paraíba aumentou significativamente o número de processos de trabalhadores que foram demitidos e que agora buscam pelos seus direitos, reais ou supostos.

No ano de 2015, a Justiça do Trabalho da Paraíba recebeu na sua 1ª Instância 36.189 processos e, no ano passado, o número de ações subiu para 39.623. Nos dois primeiros meses deste ano de 2017 já foram protocoladas 6.021 novas ações trabalhistas, enquanto que em 2016, no mesmo período, foram 5.703 e, em 2015, 4.932.

Esse diagnóstico de ascendência no número de ações foi confirmado esta semana, em entrevista exclusiva ao Paraíba Total, pelo novo presidente do Tribunal Regional do Trabalho na Paraíba (TRT), desembargador Eduardo Sergio de Almeida. “Quando o país vive um período de estabilidade ou de crescimento econômico temos uma grande empregabilidade, as pessoas buscam menos o reconhecimento de direitos, reais ou supostos. Em períodos de crise é o inverso, aumenta o número de demissões e o cidadão vai à Justiça em busca de seus direitos. Por isso, estamos em ascendência quanto ao número de ações”, afirmou Eduardo, que também foi advogado militante por mais de 13 anos e como juiz titular, nas Varas do Trabalho de Guarabira, Itabaiana e 7ª Vara de João Pessoa, além de mestre em Direito e pós-graduado em Filosofia e Direito do Trabalho pela Universidade Castilla La Mancha, na Espanha.

Ao longo da conversa o novo dirigente falou da expectativa e metas para sua gestão frente ao TRT da Paraíba até janeiro de 2019 e de temas atuais como o andamento da Reforma Trabalhista e das execuções processuais, que segundo ele é hoje, os gargalos da Justiça do Trabalho.

“O principal gargalo é a chamada execução. É quando o cidadão ganha a ação, mas na hora da execução ou se depara com um devedor que frauda os direitos dos desempregados ou frauda essa execução, transferindo bens para o nome de terceiros. Em outros casos, a pequena ou média empresa vai à falência e não deixou nada de patrimônio. Não há o que fazer. A ação está ganha, mas infelizmente, não é possível transformar o direito do trabalhador, reconhecido judicialmente, em dinheiro”, destacou ele que assumiu o cargo de desembargador no Tribunal do Trabalho da Paraíba em setembro de 2011, além de procurador Judicial concursado em Pernambuco.

Confira a entrevista completa:

- Como anda o quadro de magistrados e servidores da Justiça do Trabalho, principalmente nas varas do interior, são suficientes?

Em relação aos magistrados nós temos um número suficiente, tanto de titulares das varas quanto de juízes substitutos. Em relação a servidores, temos um percentual alto. Proporcionalmente, somos o tribunal com mais servidores. No entanto, é um quadro envelhecido, boa parte desses servidores já tem condições de requerer aposentadoria, e está concentrado principalmente em João Pessoa e Campina Grande.

- Diante da escassez de servidores nas varas do trabalho do interior existe a previsão de concurso público para este ano ou para o ano que vem?

Não, existe uma proibição por parte do TST (Tribunal Superior do Trabalho) que não permite a realização de concurso, a não ser para áreas muito especializadas como informática, por exemplo. Mas, para esta área ainda temos um concurso válido e temos nomeados servidores. Mas, para o servidor em geral, não há previsão de concurso. 

- Quanto à previsão de reestruturação do TRT, o Tribunal está trabalhando na reestruturação da jurisdição. Como está este trabalho e no que ele pode resultar?

Há uma comissão formada por juízes e servidores para estudar uma readequação na jurisdição. Vamos a um exemplo: Guarabira é uma vara que tem uma quantidade enorme de processos e uma jurisdição muito ampla, com 21 municípios. Já Areia tem em sua jurisdição 12 municípios e muito menos processos. Nesse caso, podemos ampliar a jurisdição de Areia retirando municípios da Vara de Guarabira, com benefício para o jurisdicionado e para os advogados. Ou seja, em Guarabira estaríamos garantindo mais celeridade no julgamento dos processos, já que haveria um equacionamento entre as duas varas em relação ao número de processos apreciados e decididos.

- Isso tem prazo, presidente?

Este ano ainda, seguramente, faremos algumas adequações. Esse é um trabalho permanente porque sempre existirá necessidade de mudanças. Um município, por exemplo, pode estar mais perto de Guarabira, mas digamos que o Governo do Estado resolva construir uma estrada facilitando totalmente o acesso à cidade de Areia. Nesse caso, este município poderá passar tranquilamente para aquela jurisdição por essa facilidade. Nós temos um caso contrário, a vara de Itabaiana tinha competência para julgar as causas do município de Natuba. Só que, apesar de ser mais próxima geograficamente de Itabaiana, não existia acesso. E por isso as causas oriundas de Natuba foram deslocadas para a jurisdição de Campina Grande a pedido das partes. É um trabalho permanente que não precisa de grandes estudos, mas exige atenção a essas mudanças.

- Em linhas gerais, quais sãos os principais gargalos da Justiça do Trabalho? Onde o senhor considera que é necessário avançar?

O principal gargalo é a chamada execução. É quando o cidadão ganha a ação, mas na hora da execução ou se depara com um devedor que frauda os direitos dos desempregados ou frauda essa execução, transferindo bens para o nome de terceiros. Em outros casos, a pequena ou média empresa vai à falência e não deixou nada de patrimônio. Não há o que fazer. A ação está ganha, mas infelizmente, não é possível transformar o direito do trabalhador, reconhecido judicialmente, em dinheiro. 

- A crise econômica está impactando no aumento do número de processos na Justiça do Trabalho?

Sim. Quando o país vive um período de estabilidade ou de crescimento econômico temos uma grande empregabilidade, as pessoas buscam menos o reconhecimento de direitos, reais ou supostos. Em períodos de crise aumenta o número de demissões e o cidadão vai à Justiça em busca de seus direitos. Veja os números: No ano de 2015, a Justiça do Trabalho da Paraíba recebeu na 1ª Instância 36.189 processos e, no ano passado, 39.623. Nos dois primeiros meses deste ano de 2017 já recebemos 6.021 ações trabalhistas. Em 2016, no mesmo período, foram 5.703 e, em 2015, 4.932. Estamos em ascendência quanto ao número de ações.

- Qual é o real papel do TRT na Paraíba? Como é, de fato, a sua atuação e contribuição diretamente junto à sociedade?

Eu penso que é um Tribunal de grande respeitabilidade na região, eficiente e moderno. Temos um processo totalmente eletrônico já há vários anos, com juízes extremamente bem preparados com uma vida acadêmica ativa, com doutorado e com livros publicados. Há um bom número de servidores no Tribunal, isso significa renda porque esse pessoal recebe remuneração do Governo Federal e gasta a maior parte desta renda no Estado da Paraíba, movimentando a economia. Isso gera um impacto positivo muito grande. Além da questão puramente econômica, existe a questão pedagógica. Um tribunal bem estruturado como o nosso profere decisões que, em curto prazo, implicam diretamente na relação patrão e empregado. Aliás, impacta na sociedade como um todo. Empresas que descumpriam a legislação, depois condenadas, passam a ter uma atitude mais correta e de respeito à legislação e aos direitos do seu trabalhador. Eu penso que a Justiça do Trabalho é fundamental no Brasil, a exemplo do que ocorre em outros países, e é fundamental na Paraíba. O TRT tem uma importância enorme na melhora das relações sociais, tendo como função principal a de evitar conflitos, a de pacificar as relações sociais entre patrão e empregado. A meu ver, a campanha levada a cabo por alguns políticos - de desprestígio da Justiça do Trabalho - é altamente equivocada. Se não houvesse a Justiça do Trabalho, o que o trabalhador faria quando logrado nos seus direitos pelo empregador? Boicotar empresas, quebrar máquinas? Porque, sem a possibilidade de reclamar seus direitos na justiça, o trabalhador se vinga de alguma maneira. É como a questão sindical: em alguns países, como a Espanha, onde estudei, os empresários fazem questão da existência de sindicatos representativos, porque se o trabalhador não tem representação sindical adequada, não há interlocutor com o qual negociar. No nosso caso, em uma comparação meramente explicativa, se não tivéssemos a Justiça do Trabalho, o trabalhador teria que recorrer a outros meios, talvez inidôneos, para de alguma maneira se vingar daquele ato patronal que não respeitou seus direitos.

- Como funciona a dinâmica de relacionamento entre o TRT com os demais poderes do Estado?

Muito bem. Em relação ao Tribunal de Justiça, por exemplo, temos um convênio para pagamentos de precatórios (que são condenações contra os entes públicos – estado, municípios e a própria União). Este dinheiro é repassado ao TJ e, parte é usada para pagamento dos precatórios da Justiça Federal Comum e parte para a Justiça do Trabalho. É um convênio que vem funcionando bem. E há, ainda, a possibilidade de outros convênios, na área de informática, por exemplo. Como nós temos maior know-how em informática, porque nos informatizamos mais cedo, temos condições de oferecer essa expertise à Justiça Estadual da Paraíba.

- Quais são os projetos a curto, médio e longo prazos do TRT13?

O projeto a curto e médio prazos é a construção do fórum trabalhista de João Pessoa. Apesar de termos mais de 30 anos da instalação do Tribunal do Trabalho na Paraíba, não temos um Fórum próprio de Primeira Instância na Capital. O Tribunal tem suas instalações próprias, mas a Primeira Instância não. Nós estamos realizando uma obra que vai resolver o problema da instalação das Varas do Trabalho e esse é um grande projeto com o qual várias administrações que me antecederam também estiveram comprometidas. 

- Em que fase está a construção?

Está indo bem. Nós tivemos um problema orçamentário muito grave no ano passado, quando só foram liberados R$ 800 mil para a construção do fórum. Mas nossa perspectiva, para este ano, é que sejam liberados R$ 10 milhões, o que vai acelerar em muito a obra. 

- Todas as outras varas do interior do Estado têm sede própria?

Exatamente. Campina Grande tem cinco varas funcionando em um prédio bom, adequado e relativamente novo, situação vivida em todos os outros municípios onde atuamos. Somente em João Pessoa é que funcionamos em prédio alugado, cujas condições de trabalho não são tão boas.

- A gestão do senhor vai até janeiro de 2019. Quais suas expectativas e suas metas de trabalho para este período?

A expectativa é que as verbas aprovadas sejam liberadas para que possamos prosseguir com a construção do fórum, para renovar equipamentos e para fazer as obras que são necessárias nas unidades jurisdicionais. É uma administração de continuidade, como tem sido as demais. Há um compromisso de todos aqueles que dirigem este Tribunal com a melhora contínua na prestação jurisdicional e com a melhoria das condições de trabalho dos magistrados e servidores.

- Qual a opinião do senhor sobre a reforma trabalhista?

A pretensão de alguns congressistas e, talvez, do Executivo também, é uma reforma trabalhista que precariza direitos do trabalhador. Há uma ideologia disseminada de que quando se precariza e se subtrai direitos, se aumenta a empregabilidade. Isso é uma falácia, não acontece em lugar nenhum do mundo. Quando a economia está em crise, os empresários deixam de investir e não é porque há tais e tais direitos trabalhistas. Na Alemanha, a jornada de trabalho semanal é de 38 horas, e os trabalhadores alemães têm uma grande proteção social. A Alemanha é o país mais rico da Europa, com grande empregabilidade. Neste fenômeno em que milhões de refugiados saíram da Síria e foram para Alemanha, no início, foram muito bem recebidos porque o país tinha uma escassez de mão de obra. Esse discurso de que se vai precarizar e subtrair direitos para facilitar a vida das empresas e dos investimentos, penso que é equivocado. Na verdade, o que se quer é aumentar a lucratividade das empresas, prejudicando enormemente a sociedade porque isso implica no aumento dos acidentes do trabalho, do estresse, do adoecimento. Você repassa gastos que deveriam ser das empresas para o Estado, para a sociedade. E o modelo que se alardeia com argumentos, por exemplo, de que a China cresce muito porque não tem direitos trabalhistas, é preciso saber qual a sociedade que se quer. Eu gostaria de viver em uma sociedade como a europeia, onde a renda é bem distribuída, onde o trabalhador tem proteção contra desemprego, contra doença e tem respeito e cuidado na velhice. Na China, o trabalhador sequer tem previdência social. Lá, o cidadão adoeceu ou ficou velho, ou conta com o auxílio da família, de uma poupança que fez, ou é descartável, o que é no mínimo uma crueldade. Quem não tem pobres na família, nas amizades da juventude ou mesmo na maturidade? Darci Ribeiro, no seu famoso livro O Povo Brasileiro, diz que os engenhos de açúcar eram máquinas de gastar gente. Para muitos, a fábrica, o trabalho precário é máquina de gastar gente. Gente é barato, substitui-se facilmente. Se um vai embora ou morre, há dez querendo o emprego dele. É assim que muita gente ainda vê os demais seres humanos. No Brasil não há cidadania plena. Pobre não tem cidadania. Há um sociólogo brasileiro muito famoso, chamado José Murilo de Carvalho, que escreveu livros muito importantes como Os Bestializados e Cidadania no Brasil. Nesse segundo livro, ele diz, com outras palavras, que, no Brasil, tem uma sobrecidadania, aqueles que estão acima da lei, e uma subcidadania, aqueles que a lei só existe para punir; é a lei penal. Para o pobre, a lei significa o castigo, a repressão. E para os muito ricos, a lei só funciona em seu favor.

Fonte: Redação Paraíba Total