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A PEC nº 72 e os novos direitos dos empregados domésticos. Por André Machado – Juiz do Trabalho

publicado: 07/08/2013 09h25 última modificação: 30/09/2016 10h10

 

Muito se falou, ao longo dos últimos anos, sobre a necessidade de equiparação dos empregados domésticos aos demais trabalhadores urbanos rurais, no que diz respeito ao rol de direitos constitucionalmente assegurados no art. 7º da Constituição da República.

Tratava-se de romper cultura que remetia aos tempos da escravidão, em que os senhores dispunham de serviçais encarregados das mais diversas atividades em prol da entidade familiar sem qualquer contraprestação digna. Contudo, a sociedade brasileira evoluiu e, a exemplo do que ocorreu em outros países, compreendeu a necessidade de reconhecer a dignidade da pessoa humana e o valor social do trabalho sempre que se tratasse dessa modalidade de trabalho. Aliás, o povo brasileiro, diria, apenas sucumbiu aos ditames trazidos no art. 1º, incs. III e IV, do referido texto republicano.

Por meio da PEC nº 72/05, o Congresso Nacional equiparou os empregados domésticos aos demais trabalhadores, conferindo-lhes proteção contra a jornada excessiva e a dispensa arbitrária, por exemplo, estendendo-lhes também o direito ao FGTS sobre o salário percebido, os intervalos intrajornada e interjornada e a proibição do trabalho noturno, dentre outras garantias.

O Senado Federal, em sessão ocorrida em 11 de julho último, aprovou o Projeto de Lei nº 224/13, regulamentador da alteração constitucional, pelo qual dirimiu, num primeiro momento, inúmeras dúvidas decorrentes da novel legislação. Tramita agora, na Câmara dos Deputados, projeto de revisão (PLP nº 302/13) para confirmação daquele texto.

Em rápidas palavras, destaca-se a definição do empregado doméstico como sendo aquele que “presta serviços de forma contínua, subordinada, onerosa e pessoal e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família, no âmbito residencial destas, por mais de 2 (dois) dias por semana” (art. 1º do PL). Cai por terra, dessa forma, a dúvida sempre presente se aquela diarista, que comparece uma ou duas vezes na semana na residência do beneficiário dos serviços, é, em verdade, uma empregada doméstica, positivando-se entendimento jurisprudencial já consolidado pelo Tribunal Superior do Trabalho - TST.

A lei prevê, ainda (art. 2º, § 4º), a compensação do trabalho extraordinário, por meio de acordo escrito entre empregado e empregador, com redução da jornada em outro dia ou folga compensatória, detalhe que não poderia escapar ao legislador em razão da especificidade das condições em que esse trabalho é prestado. Admite, mais (art. 10), a possibilidade de prestação de serviços no regime 12 x 36, ou seja, de doze horas de serviço por trinta e seis de descanso, o que contempla a possibilidade de trabalho por parte dos cuidadores de crianças e idosos, sem onerar, de forma demasiada, os seus empregadores.

O § 7º, do art. 2º, por sua vez, trata de excluir do tempo de trabalho remunerado todos os intervalos e períodos em que o trabalhador, residindo no local de trabalho, não preste serviços efetivos aos seus empregadores, esclarecendo sobre grave e legítima preocupação destes últimos.

No que diz respeito ao fundo de garantia, a legislação aprovada no Senado Federal previu (art. 22) a criação de uma espécie de fundo formador de um capital apto a custear a multa de 40%, devido ao empregado dispensado sem justa causa, mediante depósito mensal do equivalente a 3,2% do salário do empregado (em acréscimo aos 8% do próprio FGTS). Tal medida desonera o empregador do dispêndio total e imediato à dispensa, garantindo-lhe, por outro lado, a movimentação em seu favor da importância acumulada em caso de pedido de demissão ou dispensa motivada.

A legislação em referência ainda se debruça sobre outros aspectos fundamentais à regulamentação do trabalho doméstico, dentre os quais, as justas causas dada pelo empregado para a ruptura contratual pelo empregador (incorrendo em lamentável equívoco, no particular, ao incluir, dentre elas, a “embriaguez habitual ou em serviço”, já que a própria Organização Mundial da Saúde – OMS já a classifica como doença, não se tratando, pois, de justa causa); a fruição de benefícios previdenciários (licença-maternidade, por exemplo); a tributação de empregadores domésticos; e os procedimentos administrativos e judiciais, etc.

Cumpre, pois, a finalidade de eliminar inadmissíveis e injustificáveis distorções entre brasileiros trabalhadores. Se não temos o melhor texto regulamentador, o que se admite, de certa forma, em razão da brusca ruptura cultural que a alteração constitucional causou, temos avanços que não podem ser ignorados e que precisam ser assimilados pela sociedade, sob pena de tornar-se letra morta e fator de mais demandas na Justiça do Trabalho a quem cabe, por definição constitucional, dirimir os conflitos surgidos a partir dessa prestação de serviços.

Tais reparos necessários serão objeto de nota técnica e sugestão de substitutivo pela ANAMATRA – Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho que busca a plena garantia dos direitos sociais dos empregados domésticos, como, de resto, de todos os trabalhadores brasileiros.